quarta-feira, 5 de outubro de 2011



O Sonho do Capoeira

Uma coisa é certa, o que o Mestre Pastinha na sua ainda desconhecida sabedoria dizia: seu fim é inconcebível ao mais sábio dos mestres...!!
Há algumas semanas passadas (setembro 2011), estive em Teresina, Piauí, onde pude mais uma vez participar de um lindo evento, entre batizado, rodas, bate-papos e tanta coisa linda que rola num convívio entre os capoeiristas quando se encontram, teve um "Premio Mestre Albino" onde os alunos do Mestre que nomina o referido Prêmio, ou seja, o Mestre Albino, ofereceram um linda lembrança a diversas pessoas que foram por eles escolhidas por seu relevante contributo à capoeira, ao grupo, e à sociedade...
Na verdade essas coisas, embora sempre executadas com muita competência e amor pelos alunos do Grupo Escravos Brancos, não foram o que tornaram aquela ida a capital do Piauí uma coisa tão especial...
O que marcou fortemente a todos os que ali estiveram, foi a inauguração do Sítio adquirido pelo Mestre Albino e que ele generosamente compartilhou com seus amigos e camaradas que ali estiveram para o seu evento...
Também parece algo normal, quando visto apenas como um novo espaço onde o Mestre irá viver e conviver com sua família, seus alunos, seus discípulos, seus amigos e camaradas...
Mas, aos poucos, fui percebendo do que se tratava na verdade aquele novo espaço...!
Na medida em que íamos convivendo e conversando com o Albino e ele falando sobre seus planos para o lindíssimo lugar que instalou a sua nova casa, as coisas iam tomando uma dimensão totalmente inusitada...
Aquele lugar era um velho sonho do Mestre, que naquele momento estava se materializando!
Trata-se do local onde ele irá desenvolver importantes projetos, tais como um centro de treinamento e convivência, alojamentos, áreas de plantio de hortas e cereais, uma barragem adaptada para a piscicultura, quiosques sobre árvores, galinheiro, entre diversas coisas que ele entusiasmado ía nos informando e explicando...
Após alguns dias naquele convívio maravilhoso, comecei a perceber que o Mestre Albino não deixava de brilhar os seus olhos enquanto falava, com o entusiasmo de um menino, desenvolvia mentalmente seus projetos e todos os presentes iam se contagiando com a felicidade que falar daqueles projetos criava no Mestre...!
Foi aí que percebi que a capoeira naquele momento estava me trazendo outra grande lição!
Estava acontecendo na fala de Albino, que ele, diferentemente das pessoas "normais" ou seja, as não-capoeiristas, fazia planos a partir de seus ideais de capoeira, de seus sonhos com ela e nesses sonhos ele não estava só, nem por um segundo ele fazia planos para si mesmo!!
Então, cheguei a conclusão de que isso era a mais pura das energias da própria capoeira... Os verdadeiros capoeiristas não fazem planos para si mesmos!
Isso é a mais pura forma de generosidade!!
Isso é a capacidade de sonhar para si e para os outros...
Todos os planos e projetos que o Mestre Albino menciona tem uma destinação na qual muitas pessoas estão incluídas!
A capoeira nos ensina a partilhar até mesmo nossos sonhos!!
Essa capacidade é uma das mais incríveis coisas que já vi ser produzidas na prática e no mergulho para dentro da Capoeira!
Aprendemos a nos dar pela causa...
No início queremos aprender para ajudar a divulgar a capoeira.
Depois queremos nós mesmos divulga-la...
Depois nos tornamos pessoas - professores, instrutores, contra-mestres e mestres - que ajudam outras pessoas a divulgarem e a se tornarem parte da comunidade dos capoeiristas!!
Mais tarde lutamos pelo crescimento de nossos projetos e grupos dentro da capoeira... Junto às nossas famílias...
Depois, já mestres - acredito que muitos de nós - se tornam sonhadores e nos seus sonhos incluem a capoeira como forma de ajudar outras pessoas... alunos, amigos, discipulos, especiais, enfim, nos tornamos pessoas que compartilham seus sonhos!!!
Sonhos de capoeiristas, para a capoeira...
Sonhos de um amanhã povoado de alegrias, de união e de solidariedade!
Sonhos com a Capoeira!
Sonhos para a Capoeira!
Sonhos para nossa vida e tudo que nela conseguimos reunir, graças a união tão generosa que une todos nós...
e que pessoas como o Mestre Albino no ensinam, na sua dignidade, na sua integridade, na sua humildade, na sua generosidade, no compartilhar de seus sonhos!!
Sonho de liberdade, de igualdade, de irmandade!
Sonho de dias melhores, para nós e para todos os nossos irmãos...!
Sonho de felicidade, que temos como capoeiristas e que queremos compartilhar com nossos camaradas!!



terça-feira, 21 de junho de 2011

Secretaria de Esportes apoia eventos esportivos...



transcrevi abaixo os detalhes das regras e características do programa de apoio a evento da Secretaria de Esportes do DF.

Espero que nossos camaradas, que sempre sofrem com os problemas de logística e outros para a realização de eventos, possam conhecer recorrer aos recursos da Secretaria de Estado do Esporte do DF...

maiores detalhes e os formulários que devem ser preenchidos podem ser encontrados no link abaixo:

http://www.esporte.df.gov.br/




A Secretaria de Esporte oferece apoio à infra-estrutura e logística de eventos esportivos e lazer no âmbito do Distrito Federal. Confira abaixo as normas e procedimentos:

- o pedido de apoio a evento deve ser protocolado na Secretaria de Esporte com no mínimo 30 dias de antecedência à data do evento;

- a instituição solicitante deve ter sido criada há pelo menos 2 anos;

- devem ser apresentados:
1) projeto detalhado com finalidade de atendimento ao desporto de rendimento ou educacional ou de participação;
2) Documento Anexo II devidamente preenchido e protocolado na Secretaria de Esporte;
3) documentos probatórios de legitimidade do solicitante (estatuto / ata da eleição da diretoria anual / contrato social);
4) indicação do representante legal com cópia de sua documentação pessoal (RG e CPF);
5) certidões:
a) negativa de débitos: http://www.fazenda.df.gov.br/area=770.htm
b) CNPJ: http://www.receita.fazenda.gov.br/PessoaJuridica/defaultconsultas.htm
c) negativa de débito (CND) e positiva de débito com efeitos de negativa (CPD-EN): http://www010.dataprev.gov.br/cws/contexto/cnd/cnd.html
d) regularidade com o FGTS: https://webp.caixa.gov.br/cidadao/Crf/FgeCfSCriteriosPesquisa.asp


Baixe aqui os documentos:
Legislaçao sobre o pedido de apoio a evento: Portaria nº 3, de 17/09/2008 – Publicada no Diário Oficial do DF do dia 18/09/2008
Anexo I - Normas e procedimentos
Anexo II - Instrumento de solicitação


Para mais informações:


Endereço da Secretaria de Esporte: Centro de Convenções Ulysses Guimarães, Ala Sul - Térreo. Setor de Divulgação Cultural Eixo Monumental, Zona Cívico-Administrativa – Brasília.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Capoeira tem Forum Permanente no DF...


Há cerca de dois meses foi instalado em Brasilia o Forum Permanente de Capoeira.
Isso poderia ser apenas mais uma reunião de capoeiristas, mas representa muito mais.
O processo de debate em torno da ocupação de espaços culturais, tais como teatros, museus, bibliotecas, manifestações em praças, produção musical, produção de textos e livros, etc., são a faceta "cultural" da capoeira.
Muitos capoeiristas fazem trabalhos relacionados com essa dimensão de nossa arte e não possuem qualquer tipo de apoio ou aporte de recurso de entidades do governo ou não governamentais e oficiais repassadores de recursos públicos, nacionais ou internacionais, destinados a cultura.
O mais conhecido desses fundos é o FAC, Fundo de Apoio à Cultura, que é mantido em diversos Estados e mesmo em municipios de maior porte.
Esse fundo é a mais importante medida orçamentária dos governos para suporte e apoio às ações e atores envolvidos com a cultura.
Na instalação do Fórum Permanente de Capoeira, foi criado o blog abaixo, onde estão registradas todas as questões relacionadas com a capoeira no contexto cultural do DF, sendo que daquele Fórum sairão as decisões coletivas da capoeira destinada as relações da capoeira com o poder público e o FAC...
Vale lembrar ainda, que todos os recursos públicos destinados à cultura, em geral, são repartidos entre as n manifestações culturais que se fazem representar frente ao Governo, entre as quais o teatro, o circo, a dança, a música, etc... enquanto a capoeira não estiver presente no debate em torno da partilha desses recursos ela não poderá ter sua fatia... esperar o que??
Sem presença dos capoeiristas esse Fórum poderá se esvaziar e perder sua função e meta, que é de representar os capoeiristas nas relações institucionais da Cultura.
Abaixo o link para acessar o fórum permanente de capoeira do DF...

http://forumpermanentedacapoeiradodf.blogspot.com/

Conheça... participe... dê sugestões... participe das reuniões... assim voce estará de fato representando a capoeira como genuina questão cultural...
Sucesso aos camaradas que estão nessa frente!!

terça-feira, 5 de abril de 2011

Capoeira & Educação Elementos para um diálogo interdisciplinar (continuação 2)


Princípios básicos para o ensino da Capoeira na Escola



Como condições fundamentais para o desenvolvimento e o ensino da capoeira como atividade normal do currículo escolar, essa modalidade deverá ser orientada, entre outros, segundo os seguintes princípios: Princípio do não-recrudescimento de esporte-luta: por esse princípio, ficaria implícita ou explicitamente vedado aos professores da rede de ensino, seja oficial ou privada, incentivar ou permitir a formação de mentalidade ou filosofia de luta, estrito senso, dentro da atividade de capoeira.


As justificativas para tal empecilho seriam, particularmente, evitar-se o surto de agressão já tão amplamente presente nos meios de comunicação, particularmente a televisão e nos festivais de vale-tudo, além dos inúmeros aspectos envolvidos nos conflitos entre facções de alunos e entre colégios em praticamente qualquer escola de nossas grandes cidades, sendo já registrado o crescimento desse tipo de violência em cidades menores do interior do País. Alguns principios poderiam ser descritos e nominados da maneira seguinte:


Princípio da liberdade expressiva - Através desse princípio seriam estimulados os aspectos de personalidade corporal, criando elementos pedagógicos capazes de auxiliar os alunos a conviverem com a diversidade, com a originalidade - que na capoeira é discursada a partir da filosofia atribuída ao Mestre Pastinha - cada um é cada um - e que, na prática não é vivenciada, pois existe uma pasteurização visível na movimentação dos capoeiristas praticamente de todas as correntes atuais, não deixando margem para a autenticidade e, o pior, imprimindo a inviabilidade das pessoas com características peculiares ou quaisquer deficiências/limitações físicas, como obesidade, estatura muito frágil, algum tipo de resquício de doença ou enfermidade com conseqüências motoras ou outras formas de seqüelas;


Princípio da desvinculação de grupos ou facções: Pode parecer óbvio que isso seja seguido e, no entanto, com o que já proliferou pelos projetos de implantação da capoeira nas escolas, já foi seguido, via de regra, outro caminho, sendo esses projetos imediatamente incorporados aos grupos aos quais pertencem os professores ou responsáveis...


A capoeira na escola se destina à prática educacional e, como tal, deverá estar distinta da atividade de natureza comercial ou desportiva, estrito-senso de filosofias específicas ou fundamentos coordenados segundo blocos de praticantes. Na escola deverá primar a capoeira como esporte educacional e, como tal, não deverá haver conexões às competições e rivalidades existentes entre os grupos, independentemente de quais linhas forem, pois assim se tornarão comprometidas suas bases com as mesmas do grupo original dos professores, e serão, enfim, partes desse grupo, sem independência filosófica e pedagógica portanto!


Principio da preservação e estimulação do caráter crítico-reflexivo: A capoeira possui uma dimensão de interpretação crítico-política, que a torna um componente imprescindível para a capacidade de formular reflexões históricas, contextualizadas com a nossa própria identidade cultural. Assim sendo, sabendo-se que esses processos críticos são de grande impacto na formulação e construção do caráter das pessoas, a capoeira, enquanto agente de ampliação da consciência e da formação de uma base crítica aos seus adeptos, particularmente quando em fase de formação de sua consciência sócio-cultural, como é o caso das crianças e dos adolescentes, deverá ter como pilar a possibilidade de promover e despertar tais elementos.



Adequação Técnica do aprendizado de Capoeira na Escola


Amigos, o corpo é um grande sistema de razão, por detrás de nossos pensamentos acha-se o Sr. poderoso, um sábio desconhecido...

Mestre Pastinha


As questões relativas aos fundamentos técnicos na capoeira são temas muito escassamente tocados, a não ser superficialmente, dentro de um contexto sempre mais amplo e onde muitos outros de seus aspectos, tanto teóricos, quanto filosóficos ou práticos são abordados.


Assim, nos estudos produzidos para e pela capoeira, esse substantivo de origem grega , a palavra técnico encontra-se dentro de uma limitada produção conceitual e teórica, embora seja muito naturalmente inserida dentro do debate capoeirístico, mesmo que sujeita a uma certa imprecisão, ambigüidade ou a uma gama muito ampla de abordagens, muitas vezes discordantes, como é natural no caminho de todos os estudos e pesquisas emergentes, dado que é possível se encontrar um sem número de possibilidades de sua aplicação, independentemente da corrente ideológica ou teórico-conceitual em que esteja inserida a discussão.


O uso do conceito técnico, ao que se pode verificar em autores estudiosos da corporalidade, está associado normalmente ao processo de aperfeiçoamento para a obtenção de melhores resultados e desempenhos, previsto como um pressuposto, ou planejado racionalmente pelos praticantes de atividades físicas e motoras, tendo em conta a superação de concorrentes ou de dificuldades intrínsecas ao labor desportivo ou às atividades físicas, genericamente falando.


Assim, portanto, nos parece fundamental, restringir primeiramente o conceito, definindo que sua aplicação se aplique estrito senso a um objetivo que dialogue com a racionalidade funcional e com alguns outros insights comumente presentes na capoeira, não tendo a pretensão de abranger a totalidade de sua aplicação, dada a abrangência e a própria diversidade dos enfoques possíveis, quando tratamos da capoeira.


Além disso, poderemos ainda, à guisa de uma exemplificação dos aspectos eminentemente práticos das técnicas encontradas na capoeira e, também de maneira pontual e ilustrativa, repassar alguns aspectos históricos discutidos ou percebidos na análise evolutiva do conhecimento e dos princípios técnicos da capoeira em sua trajetória emancipatória enquanto campo de conhecimento autônomo.


Fragmentos Teóricos da questão Técnica


Na nossa busca por elementos conceituais aplicáveis, mesmo que com alguma margem de arbitrariedade, encontramos, por exemplo, a definição de técnica, como sendo “specific detailed method of executing an action of the body” (Canhan, p.449), que reduz o conceito a uma aplicação especificamente motora, naturalmente respaldada por uma objetividade promovida e racionalidade para o desempenho olímpico, onde cada competidor tem que obter um desempenho minucioso, por mais ínfima que possa parecer a diferença em relação aos outros competidores.


Trazido para a capoeira, esse princípio não seria tão ampla ou imediatamente válido e aplicável, considerando a assumida identidade holística que encontramos valorizado na expectativa de êxito presente na capoeira, ou enquanto definição de proposta ou medida de sucesso nela latentes, embora pudéssemos reconhecer a validade de tal diretriz como balizadora de um potencial qualificador do desempenho capoeirístico, talvez ainda não atingido ou visado no estágio atual de refinamento teórico-prático da capoeira.


Num outro exemplo, encontramos a afirmação: “é um esporte que margeia a arte; a busca da performance, de controle neuromuscular e senso rítmico, o equilíbrio total do corpo e uma postura correta e saliente são as principais características dos que praticam a ginástica olímpica” , donde poderíamos extrair alguns fragmentos e, pelo menos em parte, tomar o conceito e aplicá-lo à capoeira.


Senão, vejamos: A capoeira indiscutivelmente margeia a arte. Ou melhor, a capoeira é uma arte de onde derivou – pelo livre arbítrio de sua prática e recriação histórica (Zulu, 1995), sua desportivização e, portanto, seu acervo conceitual e técnico.


A busca da performance tendo em conta premissas estéticas estão hoje associadas às praxes capoeiranas, o que, juntamente com o controle neuromuscular e o senso rítmico formam um conjunto de premissas e de expectativas de padrões técnicos e expressivos de seu desempenho. Existem dificuldades para a definição de conceitos como o equilíbrio total do corpo, o qual, no caso da capoeira, nos pareceria mais adequado se dito como equilíbrio circunstancial, ou seja, para o capoeirista o equilíbrio tem uma destinação operativa e vital como parte de sua técnica dinâmica, tendo em conta sua relação dialética com outro parceiro/adversário, que irá explorar seu domínio técnico corporal sobre esse mesmo equilíbrio.


O equilíbrio e o espaço enquanto técnicas e fundamentos de suporte ao desempenho capoeirístico, trazem a saga fundamental da competição capoeirística, ainda que lúdica, pois mesmo os mais restritivos divergentes dos grupos de práticas capoeirísticas de algum modo dialogam em torno dessa premissa, desse objetivo, dessa competição de amigos, que seja. Ou seja, mesmo totalmente lúdico, o jogo de capoeira traz a disputa pelo espaço e pelo equilíbrio como foco da pontuação simbólica, entre seus contendores.


A questão da postura, também, oferece algumas distinções no que tange a capoeira, mesmo registrando que segundo algumas correntes ou vertentes dentro dela existam algo normalmente denominado de postura correta, isso contraria um dos fundamentos basilares da capoeira que é a criatividade!


Ou seja, o fato de se definir algo como correto pressupõe a existência de seu reverso, e, portanto, de algo que seria a priori errado, equivocado ou deficiente e nisso residiria um ponto de tensão entre correntes que são favoráveis à espontaneidade expressiva em confronto com idéias calcadas em princípios técnicos padronizadores do desempenho capoeirístico.


É fato, porém, que na capoeira a discussão da postura abrange a ginga e, nesse caso, a questão da eficiência técnica tomaria outra dimensão, uma vez que deixaria a esfera estética e adentraria o terreno competitivo, ou pelo menos mais plausível, por envolver a competição entre adversários, onde uma ginga passa a ser comparável com outra, caracterizando-se como o mais elementar fragmento da técnica capoeirística: o jogo da capoeira e, com isso, a comparável capacidade de cada um!


As questões ditas técnicas na capoeira passam, para permitir um diálogo com a sua veia desportiva, ainda em sua maior parte por ser definida e estudada, frente aos conceitos mais atuais de dinâmica autonomizada pelo diálogo que a capoeira propicia, seja pela parceria, típica de algumas modalidades de competições, seja através da busca do melhor desempenho, julgados ambos os modelos por meritórios jurados, mestres antigos e considerados como ícones de credibilidade de competência...


Os modelos de competições de capoeira foram escritos a partir das experiências dos JEB’s e trazem até hoje as mesmas características, a busca do maior e melhor fundamento ao lado do melhor resultado global, nisso caracterizando-se o ritmo, a beleza da movimentação, a maior capacidade de definir o jogo, no que já foi entendido como modo de pontuação objetiva, mas sempre se buscando atender aos requisitos da melhor tradição.


Finalizando quanto aos objetivos de uma pequena análise da capoeira enquanto questão técnica e competitiva, cabe registrar a importante contribuição que o Dr. Cláudio Queiroz, na capoeira conhecido como Mestre Cláudio Danadinho, PHD e titular da cadeira de arquitetura da Universidade de Brasília, sempre destaca em seus debates com as questões da capoeira: a capoeira tem o sentido da brasilidade em sua filosofia de existir e competir.


Assim como o jogo de frescobol que acontece nas praias brasileiras, ninguém precisa vencer; o tempo de duração do jogo não precisa ser definido ou cronometrado; a maioria das vezes não é definida, as regras são normalmente implícitas e raramente discutidas; além disso não existe a marcação de pontos no sentido específico e comumente adotado em outras modalidades...


A capoeira está mais preocupada com a felicidade dos competidores, na verdade parceiros e o resultado do jogo é sempre colocado em segundo plano, não sendo do interesse da maior parte das comunidades capoeirísticas, salvo a capoeira federada, pretensamente candidata aos espaços de esportes de auto-rendimento. Sonho de muitos defensores dessa bandeira, visando a sua escalada no podium dos esportes olímpicos oficiais algum dia.


(continua brevemente...)

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Os Sete Desafios da Capoeira...




O que pode vir a ser um critério justo e inquestionável para que alguém possa ser considerado um Mestre de Capoeira?
Essa pergunta surge em razão de um interessante estado de coisas que vivemos dentro da capoeira.
Tal pergunta é feita pela maioria dos próprios capoeiristas, que vive criticando que A não deveria ser Mestre, ou que B se tornou Mestre Varig – atravessou o Atlântico e se tornou Mestre do outro lado...
Não resta dúvidas, pois, que isso se torna um problema mais complexo ainda, em função da expansão geográfica e do imenso contingente de praticantes de capoeira espalhados pelos quatro cantos do mundo, cada um seguindo linhagens e filosofias independentes.
Hoje a capoeira envolve também uma questão de mercado de trabalho e de espaço comercial, o que torna o título de Mestre algo que significa agregação de valor à oferta do serviço de ensino e de outras formas comerciais da capoeira.
Muito se engana quem, por inocência ou interesse acreditar que pode definir um critério de julgamento único qualquer e com isso resolver esse impasse, uma vez que a capoeira tem raízes que não estão sob o controle de nenhuma pessoa ou entidade isoladamente, por mais competente e bem intencionada que seja a pessoa ou a Entidade.
Alguns capoeiristas, ávidos em se tornarem reconhecidos por seus próprios méritos e por seu próprio nome, nome de Mestre é claro, se afastam sem maiores explicações de seus grupos originais, buscando afirmar sua personalidade sem o controle de outras pessoas ou do seu Mestre original.
Temos aí, portanto, o problema que vamos tentar discutir neste artigo.

Raízes culturais da Capoeira
Originalmente a capoeira é uma cultura regional, o que inclusive foi apropriado genialmente pelo Mestre Bimba, quando criou o seu Centro de cultura Física e Regional, o que deu origem ao nome Capoeira Regional.
Ela é o fruto de um processo social, forjado numa ética clara e simples, através da qual os Mestres eram simplesmente aclamados pela comunidade, como parte da evolução da expressividade de seu desempenho, seu trabalho, seus alunos.
Isso acontecia inicialmente dentro da pequena comunidade urbana, uma vez que a sofisticação da capoeira enquanto prática organizada e reprodutiva, tal qual a conhecemos hoje, é um processo evolutivo urbano.
Os capoeiristas que surgiam espontaneamente, praticantes de outiva, que iam reproduzindo o conhecimento que recebiam do convívio com outros capoeiristas e principalmente com seus próprios Mestres, se tornavam conhecidos pelos vizinhos da mesma rua, dos quarteirões próximos e esquinas, áreas próximas aos seus locais de prática, normalmente os largos e as praças.
Desses bairros e de regiões das cidades ia se espalhando o reconhecimento e a notoriedade daquele Mestre, que passava a ter esse título naturalmente, enquanto ia desenvolvendo-se no jogo e no trabalho dentro da capoeira.
Vale observar que raramente esse tipo de atividade era remunerada, o que tornava o título de Mestre desvinculado completamente da idéia de poder econômico ou de mercado de alunos.
Era apenas o reconhecimento que ia ocorrendo, na medida em que ele ia se destacando no jogo e sendo cada vez mais reconhecido.
E ensinava. Por isso o capoeirista passava a ser considerado o Mestre daquele local.
Alguns capoeiristas, bem nos idos da primeira metade do Século XX, conquistaram respeito ou temor de uma cidade inteira, como foi o caso do memorável Besouro Mangangá, de Santo Amaro da Purificação.
Isso ocorreu também no Rio de Janeiro, onde se notabilizaram figuras como Manduca da Praia, Madame Satã, e muitos outros.
Em Recife temos a história de Nascimento Grande, considerado um Mestre na arte da capoeiragem por aquelas bandas.
Enfim, a comunidade aclamava seus capoeiristas, tornando-os Mestres.
Eles eram Mestres primeiramente de uma comunidade, depois se tornavam conhecidos numa região das grandes cidades, particularmente Salvador, Recife e Rio de Janeiro.
Mestres, artistas populares, nascidos e erguidos pelo próprio povo, como também eram chamados os Mestres-artesãos do barro, da madeira, dos grupos de ciranda ou de Folia de Reis, Maracatu, Marujada, etc.
Mestres do Povo, sem sobrenome ou outros títulos pretensiosos.
Quando alguém sugeria: procura lá o Mestre Waldemar que ele tem berimbau muito bom! Era uma informação cristalina, um fato consumado. Uma comunicação precisa e clara.
Não precisava esclarecer coisas do tipo: ele é Mestre de que? De que estilo? Quem deu a ele esse título? Etc. A condição de Mestre era tão natural como um pré-nome qualquer. Fazia parte do nome e dos atributos do seu portador. E todo mundo sabia o porquê. Ou então não carecia saber.
O mundo se modificou. A capoeira o seguiu.
Da rua para o bairro, do bairro para a cidade. Da cidade para a região. Da região para o Estado. Do Estado para o País. Do País para o mundo.
Mesmo tendo evoluído de Aldeia Local para uma Aldeia Global, a capoeira autêntica busca levar suas características originais e se reproduzir dentro dos seus princípios e raízes, independentemente do local onde está sendo praticada, em que cultura distante, em que língua, em que povo...
A capoeira leva a mensagem de nossa comunidade mais interior para o mundo. Talvez se ela perder essas características deixe mesmo de ser capoeira!!
O que forjou a capoeira urbana e que ganhou o mundo, foi a mestria cunhada dentro da comunidade...
Os novos tempos impõem uma sofisticação progressiva, resultado de uma institucionalização que assimila o espírito capitalista e o implanta dentro das escolas (filosoficamente falando) de capoeira.
E não cabe aqui julgar o mérito ou o direito disso de quem quer que seja. Não é esse o interesse desse artigo.
A capoeira tem demonstrado que pode ser uma instituição digna, da mesma forma que qualquer outra, podendo ainda ser lucrativa e economicamente viável, podendo se constituir num meio de vida de muita gente.
Ótimo para quem lucrar com isso e melhor ainda para a capoeira, no que ela incorporar de profissionalismo e de novos instrumentos para a sua auto-organização e reprodução histórica.
Se a capoeira percorreu o caminho que fez até agora, existiu um fato imprescindível nisso: sua reificação obstinada feita pelo Mestre Bimba.
O Sr. Manoel dos Reis Machado, em sua visionária vanguarda, graças a Deus sua gloriosa e bem-aventurada empreitada, deu o passo fundamental para que a instituição capoeira surgisse.
O trabalho dele, foi antes de tudo sistematizante, reformulante, convertendo a capoeira numa eficiência planejada, resgatando-a de uma prática sem método, convertendo-a num processo de aprendizado.
A importância dele é reconhecida até mesmo pelo mais fiel escudeiro da própria capoeira angola, a raiz, a mãe, a essência da capoeira, ainda que alguns não lhe poupem críticas também, pelos inevitáveis efeitos colaterais de seu trabalho.
De algum modo a capoeira angola foi também beneficiada pelos espaços abertos pela capoeira regional do Mestre Bimba, sendo quase impossível a qualquer capoeira, de qualquer corrente, ficar indiferente ao que Mestre Bimba fez.

Os Sete Desafios Elementares
A seguir, elegemos alguns requisitos básicos, dentro da ética da capoeira, em cima dos quais iremos tentar fundar uma proposta de definição aceitável de critérios que possam ser utilizados para que alguém possa ser considerado um Mestre de capoeira.
Tais critérios podem ser considerados tanto hoje, como historicamente o foram, utilizados como méritos associados ao título de Mestre de capoeira.
São eles:
1. A família
2. A Camaradagem
3. A arte
4. A prosperidade
5. A Comunidade
6. Os Alunos
7. A Capoeira

Desafio n. 1 - A Família
A família sempre foi uma instituição basilar na vida do homem.
No caso da capoeira, a família sempre foi o primeiro desafio dos seus praticantes.
Ou seja, ser capoeirista, se mantendo em harmonia com a família, sem conflitos, sem permitir o distanciamento do convívio familiar.
Não permitindo que filhos e/ou esposas, sejam simplesmente abandonados em virtude dos compromissos assumidos com a capoeira.
Existem diversas músicas de capoeira que falam desse conflito:
Vou dizer minha mulher, Paraná, capoeira me venceu...!

Também é fato que a existência de uma família desequilibrada impacta totalmente a vida do capoeirista, como diz Mestre Brasília em sua música: se tu tens problema em casa, não vem resolver aqui...!
Felizmente, após todos esses anos e conquistas da capoeira, a predominância da relação da família com os capoeiristas é de Amor, estímulo e apoio.
Recentemente, testemunhamos o emocionante depoimento de Dona %%, mãe da Mestra Edna Regina, formada pelo Mestre Tabosa, onde ela contou a verdadeira saga pela qual passou, para apoiar sua filha a treinar capoeira.
Suas dificuldades foram inúmeras, desde problemas financeiros para custear os treinamentos, até ameaça de ser demitida, por estar envolvida com uma prática considerada ainda marginalizada, mesmo nos anos setenta, no brasil, na Capital Federal.
Foi um depoimento emocionante de amor e dedicação da família a uma praticante, sem o qual jamais teríamos hoje uma pessoa com o sucesso e o trabalho dentro da capoeira no porte em que temos a Mestra Edna, hoje ligada ao Mestre Camisa, tornou-se uma pessoa que conquistou os EUA e o mundo.
Também a responsabilidade para com a família, como um ponto fiel da balança do equilíbrio entre o fascinante mundo da roda de capoeira e a relação familiar.
O Mestre de capoeira, tem um outro papel fundamental, aquele Mestre do destino dos seus filhos e da sua família.
Esse é um desafio que pode lhe custar qualquer outro sucesso tornar-se inexpressivo: não adianta ser uma pessoa bem sucedida na capoeira e ser um pai ou uma mãe fracassado perante os filhos, por abandoná-los a própria sorte ou por não ter competência para cuidar deles e orientá-los.
Desafio n. 2 - A Camaradagem
Mesmo que alguém possa se fazer aceitar nas rodas da capoeiragem pela imposição da força ou de outros argumentos apelativos, quem não for aceito pelos capoeiristas, como camarado como diziam os velhos Mestres, tem vida curta dentro das vorta do mundo...
O mundo subjetivo da capoeira, sua linguagem, seus segredos, seus enredos, suas estórias, bem como sua história, só é acessível a quem for aceito pela comunidade.
Só tem acesso à roda da capoeiragem, quem conseguir ser inserido na roda da camaradagem...
Mesmo que o capoeirista, às vezes imponente demais para perceber o que está acontecendo a sua volta, não entenda isso muito cedo, a capoeiragem tem um código de ética próprio.
Alguns desses códigos vêm sendo deliberadamente desrespeitados, como é o caso do assédio para atrair alunos de outros Mestres e grupos. Normalmente o que ocorre é que as mesmas pessoas que tem por hábito convidar alunos de outros grupos para os seus, fiquem muito zangados quando acontece a mesma coisa com os seus...
Ou seja, a ética está clara, mas muitos acreditam que ela sirva apenas numa mão: faça o que eu digo, mas não olhe o que eu faço!
Isso serve apenas para ilustrar as contradições que impedem muitas vezes o capoeirista de ser aceito plenamente no convívio.
Exemplo positivo, para contrabalançar a visão do problema, é pensarmos num desses Mestres que são conhecidos pela maneira agradável com que se relaciona com a comunidade, são pessoas sempre bem vindas às rodas da capoeiragem...
Poderíamos lembrar muitas dessas pessoas, mas é sempre arriscado sermos injustos e deixar Mestres importantes de fora, mas quem não ouviu falar ou se lembra da grande personalidade de Mestre Canjiquinha, pessoa de um carisma impressionante!
Onde ele chegava, estava criada uma atmosfera agradável e sempre cheia de alegria!
No disco Músicas e Ritmos de capoeira, tivemos oportunidade de ver o seguinte verso, dedicado a Mestre Canjiquinha:
Enfim, sem se tornar aceito dentro da comunidade capoeiristica, ninguém se torna um capoeirista completo.
Mais do que isso. Ser aceito dentro dessa roda, requer uma ética e uma aceitação que ninguém pode pagar por ela... Tem que merecer.
Desafio n. 3 - A Arte
A capoeira é antes de tudo uma arte.
Isso é um fato.
A arte na capoeira se traduz de muitas formas;
A arte de construir Instrumentos, ou como se pode extrair da Umbanda, sabe-se que Ogun, o Orixá da Guerra, é ele mesmo quem forja os seus instrumentos e sua espada...
Ogun é uma das Entidades de grande força dentro da capoeira, pelo seu lado de guerra, embora tantos outros Orixás também tenham sua importância no terreno da capoeira.
O capoeirista, além de confeccionar seus próprios instrumentos, deve saber tocar, afinar. Enfim, deve dominar os seus instrumentos, ferramentas básicas da arte da capoeira. O capoeirista é um artista. Precisa realizar sua alma de artista.
Tem também a Arte da expressão, o teatro, o jogo cênico do corpo, elemento que povoa a criatividade e a capoeira dos grandes capoeiristas de presente e do passado.
A música. Ela possui um efeito transcendental para o capoeirista. Ele precisa estabelecer uma relação de amor com a música. Senão, poderá ser guerreiro, atleta, desportista, etc., mas não será um artista completo.
O Mestre da roda de capoeira é um maestro do grupo, com a sua afinação e sentimento ele embala as rodas de que participa e, mais ainda, dá uma vida especial às rodas que ele próprio promove.
Dominar os rituais de roda é uma arte que só os grandes Mestres atingem.
Os Mestres de capoeira, para atingirem sua plenitude de reconhecimento, crescimento e realização precisam conhecer e passar para seus discípulos, para que a Arte da capoeira se perpetue!
Indo mais além na questão da arte, vale lembrar que o capoeirista completo consegue se desenvolver na composição de suas próprias músicas e letras de capoeira.
O capoeirista tem uma outra vocação importante que precisa dar vazão em seu crescimento e formação: a dança! O capoeirista deve dançar espontaneamente!
A capoeira, finalmente, pode se tornar uma eficiente arte-marcial. Essa arte foi por milhares de anos a forma através da qual o homem forjou a sua superioridade, seja perante outros homens, quanto perante as suas angustias e fraquezas. Isso é a arte-marcial.
A capoeira tem um componente marcial que pode ser explorado e se tornar um importante argumento para quaisquer dessas questões.
Desafio n. 4 - Produção dentro do trabalho de capoeira
Todo e qualquer trabalho produz frutos.
A capoeira de um Mestre é um trabalho como outro qualquer.
O que representa essa produção?
Representa cada dia de aula que ele dá, cumulativamente, criando uma massa cada vez maior de conhecimento em seus alunos.
É representada pelo seu próprio conhecimento que vai sendo acumulado, criando um skill técnico cada vez mais elaborado, combinando informações que ele tem na mente, obtidas de seu aprendizado e combinadas com suas experiências cotidianas no bojo de seu labor no ensino e na sua própria prática de capoeira.
Desse seu conhecimento, aplicado em seu trabalho de ensino, ele deriva para um novo projeto, seja uma nova turma, um novo horário, um novo local de ensino e divulgação da capoeira; um evento que pretende realizar no final do seMestre ou do ano; uma festa de formatura; um batizado; uma competição interna; uma viagem com alguns alunos para participar de um evento em outra cidade; um ensaio de uma nova coreografia para ser apresentada na festa da Academia ou da escola, ou mesmo de uma data comemorativa da cidade...
Enfim, essa produção, qualquer que seja ela é o resultado que um Mestre de capoeira vai pontuando em sua caminhada pelo caminho do berimbau...
Alguns têm mais sorte ou mesmo um perfil mais empreendedor, naturalmente disponível em sua pessoa e, porisso, tem mais facilidade de ir produzindo eventos, festas, apresentações, competições, festivais, batizados, etc..
Outros são menos afortunados e tem que batalhar muito para conseguir o mínimo de realização. O mérito dos dois deveria ter o mesmo valor dentro da capoeira.
Por mais modesto que seja o trabalho de um Mestre, e isso é um fato nos Mestres mais enraizados em culturas e populações regionais dos Estados mais pobres do brasil, eles tem méritos reconhecidos em seus trabalhos: fazem rodas; fazem batizados e festas; convidam os camaradas, reúnem os capoeiristas em momentos de confraternização e energia, na qual a capoeira como um todo vai se apropriando e crescendo com esse movimento.
Também deve ser contabilizado como parte da produção dos Mestres de capoeira, os discos, os livros, palestras, conferências, encontros, reuniões, filmes, peças de teatro, apresentações, etc.
Isso tudo é parte do mérito da produção de um Mestre de capoeira.
Infelizmente, alguém que nada produza para a capoeira não será um Mestre legítimo dela. Ou será um Mestre incompleto.

Desafio n. 5 - Aceitação e respeito na Comunidade
A afirmação de um Mestre de capoeira precisa do reconhecimento social.
Se no passado o capoeirista pode ter sido marginalizado pela sociedade, isso já passou. Se não acabou totalmente, é bem provável que hoje esteja ocorrendo de forma bem sutil, ou em situações isoladas, muito especiais, particularmente por grupos que se tornam de algum modo agressivos e violentos, distribuindo toda uma sorte de visão negativa da capoeira, pois algumas vezes eles fazem questão de aparecer vestindo suas camisetas identificando GRUPO XPTO...! Deixando claro que estão dispostos a comprar qualquer briga que surja... e se não surgir nada, para não perder a viagem, criam uma.
Pelo lado positivo, os Mestres de capoeira se tornam úteis à sociedade, seja no brasil ou em qualquer país do planeta.
Isso ocorre pelo fato de que a capoeira pode transformar a vida das pessoas, particularmente para o lado do bom caminho, pois são inúmeros os projetos que se destinam a utilidade publica, envolvendo crianças de rua, ou pessoas de qualquer idade com risco social, grupos especiais como excepcionais, doentes mentais, pessoas de terceira idade, enfim, a capoeira tem sido utilizada num sem numero de projetos do mais alto interesse social.
As pessoas por trás desses projetos são Mestres de capoeira que se tornam admirados pela comunidade, respeitados por todos, acolhidos junto aos movimentos sociais das comunidades onde atuam, se destacando como pessoas de alto nível de credibilidade.
Todo movimento de capoeira deveria ter uma utilidade social para alguém.
Assim, todo Mestre de capoeira teria o reconhecimento social, que é o quinto grande desafio de nossa lista básica.
O que seria um Mestre de capoeira sem esse reconhecimento?
Que tipo de trabalho ou que tipo de formação seria dada a alunos que fossem considerados inimigos públicos? Infelizmente isso existe também.
Felizmente essa linha de trabalho que prega o atrito com a sociedade está reduzida a um número insignificante de pessoas, cada vez mais isoladas em sua vã filosofia e na sua pobre visão de mundo.

Desafio n. 6 - Formação de Alunos
Se existe uma coisa que caracteriza um Mestre de capoeira, são seus alunos. Alguém questionaria isso?
Os novos tempos têm produzido alguns fenômenos dentro do mercado da capoeira, que já tive oportunidade de comentar antes no decorrer deste texto, onde pessoas, Mestres de capoeira conhecidos, assediam alunos de outros Mestres, oferecendo seu nome, seu grupo, seu apoio e toda uma série de promessas, somadas à insatisfação que muitas vezes o capoeirista está vivendo, que isso torna-o uma presa relativamente fácil.
Nossa meta neste artigo não é discutir especificamente essa questão, mas isso tem a ver com o mérito que o Mestre deve ter com relação aos seus alunos.
Pode alguém dizer que foi o Mestre de um aluno que já chegou para treinar com ele formado?
Pode existir um Mestre de capoeira sem aluno?
Temos conhecimento de alguns Mestres que se recusam a ensinar o que sabem para seus alunos, por não quererem se expor a serem mais tarde abandonados e, junto com a saída de seus alunos, seus conhecimentos serem levados para engrossar o nome de outros grupos e outros Mestres.
Teriam eles suas razões para tal procedimento?
Ocultar o conhecimento que tem chega a ser um recurso para proteger a sabedoria da capoeira?
Será que alguns alunos chegam a migrar para outros grupos pela falta de perspectiva de um aprendizado mais profundo de capoeira onde estão?
Enfim, no nosso problema central, é um desafio para o Mestre ensinar seus alunos até que esses possam se tornar também professores e Mestres, para formarem outros professores e Mestres, para seguirem a linhagem da sabedoria da capoeira que aprenderam.
A chegada da maturidade dos alunos de capoeira criam uma situação de difícil administração para a maioria dos Mestres de capoeira.
Alguns sentem que não mais tem o controle sobre seus alunos e porisso criam zonas de atritos e de desequilíbrio na relação com eles.
Outros querem que o aluno busque uma autonomia para produzir para o grupo, o que nem sempre ele está preparado ou tem interesse em fazer e com isso também se desencadeia desarmonias e desajustes entre Mestre e aluno.
Certo é que levar um aluno do inicio ao fim de sua formação é um mérito de muito poucos Mestres. A eles a honraria de serem Mestres de capoeira que formaram outros Mestres de capoeira e com isso se tornou mais do que Mestre, se tornou um Mestre de outro Mestre.

Desafio n. 7 - A Alma da Capoeira
Na filosofia yogue a sétima esfera do ser humano é o espírito (quem tiver interesse em se aprofundar leia As Sete Lições de Filosofia Iogue, de Ramacharaka).
Na capoeira o estágio supremo do crescimento de um capoeirista seria ter em si a Alma da capoeira.
A Alma da capoeira não se traduz em qualquer palavra, talvez em muitas delas, talvez todas elas sejam necessárias e talvez nenhuma possa realmente explicá-la.
A alma existe como a essência imaterial das coisas que se incorpora aos obstinados que se entregam profundamente a sua arte, até chegarem ao ponto de se confundirem com aquela arte.
Se lembrarmos Chopin veremos que ele nasceu, sentou-se na frente de um piano e consumiu toda sua vida ali, saindo de lá direto para o cemitério, sua alma e a sua música se tornaram uma coisa única.
Isso também ocorre com a capoeira.
A Alma da capoeira está presente na sombra de um Mestre de capoeira, junto com ele. Dentro dele.
A capoeira transforma o interior de uma pessoa a ponto de fazê-la ser a capoeira ela mesma.
O Mestre Atenilo, o Relâmpago da capoeira regional como ficou conhecido, diz sobre Mestre Bimba que ele era a própria capoeira, no livro-depoimento com o seu nome produzido por Mestre Itapoan.
Essa expressão caracteriza bem o que estamos tentando passar neste artigo: o capoeirista que atinge a mestria da capoeira torna-se a capoeira! Não é possível mais separá-lo dela...
O verdadeiro Mestre de capoeira precisa ter sua Alma fincada na energia de capoeira.
Alguém que ainda não atingiu isso será Mestre de capoeira um dia. Ainda não é.