sexta-feira, 2 de abril de 2021

Adeus Mestre Zé Renato!

 


É claro que me lembro a primeira vez que nos encontramos!!

Eu estava realizando o primeiro evento de capoeira em Fortaleza, em dezembro de 1979, e você apareceu no meio da festa.

Eu não sabia de você ou do seu trabalho e presença no cenário da capoeira do Ceará.

Depois pude ver você diversas vezes, talvez menos oportunidades do que nós dois gostaríamos, mas a capoeira não marca encontro.

Eles simplesmente acontecem...

Só sei que você sempre foi um ser humano acima de todas as diferenças...

Para quem não sabe - e foi você que me contou - o seu estado de saúde se tornou instável desde o dia que você tentou passar seu pai por cima do alambrado do estádio do Fortaleza, para que ele fosse socorrido pela equipe médica que estava dentro do campo...

Nessa tentativa desesperada de salvar o seu pai, você foi espancado violentamente pela polícia que estava protegendo o campo, pois você não suportou ver o seu pai ser agredido por aqueles policiais e você comprou a briga com eles, enfrentando todos...

Esse episódio te deixou para sempre com sequelas severas...

Você nunca mais pode jogar capoeira...! Sua arte, sua grande paixão estava para sempre afastada de você...!

E sua vida seguiu como você pode viver!!

Eu trago em mim seu semblante sempre gentil comigo...

Mesmo quando pessoas sem noção tentaram nos dividir, nos tornar adversários ou inimigos, isso nunca funcionou, pois você me tinha na mesma conta que eu a você...

O meu respeito a sua história de vida sempre foi algo maior do que qualquer conversa fiada que alguém possa ter tentado.

Hoje eu sei que você está onde merece, tanto na memória dos capoeiras das gerações atuais e futuras, quanto nos reinos de Deus, onde os guerreiros tem lugar!

Eu choro a sua morte, mas sorrio pela sua história e amizade que sempre me dedicou...

Sei que as marcas das lutas em seu corpo estão curadas, pois você está agora noutro plano...

E nós, todos os capoeiras de alma, oramos e rendemos homenagem a sua história e o lugar do pódio dos desbravadores da nossa Arte, pioneiros ancestrais que construíram a estrada por onde seus discípulos irão caminhar...

Os que tenham realmente compreendido o que é ser um guerreiro!!!

Vai em paz meu irmão!!

Luz na sua ascensão!!

Leva meu carinho e meu respeito eterno!!!

🙏🏽🙏🏽🙏🏽🙏🏽🙏🏽🙏🏽

sábado, 18 de abril de 2020

A História da Capoeira do Ceará - Roda da Memória do DCE

Uma História que precisa ser contada


Eu sempre tenho dito para meus alunos e amigos que não gosto de História. Não me sinto competente para lidar com a História enquanto um tema que eu próprio tenha que enfrentar, produzir ou orientar. A razão disso é que sempre que se narra uma História, se trata de uma parte dela! Obviamente que se escolhe a parte que nos interessa. Ai é que começa a questão e a fragilidade que me invade! 
Quer dizer que sempre que contamos uma História, estamos escolhendo uma perspectiva dela e, naturalmente, desprezando outras tantas faces que não posso ver, não conheço, ou simplesmente não me interessa contar!
Isso torna a História uma disciplina de escolha! 
Essa ideia me incomoda muito.
Por isso, para fazer o registro dessas informações e fatos que estou compartilhando nesse texto e nos videos que irei compartilhar como parte dessa postagem, tive que entender que isso era extremamente importante, bem como me vestir da minha mais absoluta sinceridade e coerência para escolher os aspectos dessa trajetória pela qual a Capoeira é produzida e, infelizmente, onde chegamos, num momento em que a maioria está buscando seu lugar ao sol, mesmo que para isso despreze a História, a verdade ou mesmo adote uma perspectiva em que narra os fatos de acordo com o seu interesse, sempre se colocando no centro das questões, como o mais importante ser humano envolvido!
A isso infelizmente não temos como refutar. 
Tenho adotado uma postura, à qual quero sempre ser fiel e me manter coerente com ela, não só enquanto postura, mas como ética pessoal, de não me dispor ao debate onde a intenção seja criticar ou apontar defeitos de pessoas, seja quem forem elas. 
Acredito que o melhor que podemos fazer é nos tornarmos parte dos que fazem diferença. 
É disso que se trata esse tema aqui emprestado. 

Por isso estou compartilhando com meus amigos, alunos e quem mais tiver interesse, os mais importantes aspectos que elegi e que entendo serem do interesse de todos os capoeiristas e estudiosos que se interessem pela HISTÓRIA DA CAPOEIRA DO CEARÁ!

Para tanto eu produzi uma palestra, que foi apresentada em 2017, durante um movimento realizado pelo IPHAN-CE, cuja proposta era a Roda da Memória, buscando registrar os mais importantes e mais antigos movimentos de Capoeira que aconteceram no Ceará, entre os quais o espaço conhecido como DCE, que mais tarde se tornou a TERREIRO CAPOEIRA, cuja História se confunde com a História da Capoeira do Ceará. 

Esses videos contam os mais importantes fatos e demonstram a História através de documentos, fotos, imagens, etc., registrando e documentando a História da Capoeira do Ceará para a posteridade, não permitindo, assim, que os FATOS sejam distorcidos! 

Isso é feito em respeito aos capoeiristas e pessoas em geral, que participaram dessa História e que merecem o reconhecimento do seu legado!

Esses são os videos que contam essa História: 

Primeira parte: 

História da Capoeira do CE - Parte 1


A História continua: 
História da Capoeira do CE - Parte 2



E a parte a seguir conclui essa apresentação:

História da Capoeira do CE - Parte 3


terça-feira, 16 de outubro de 2018

sábado, 29 de setembro de 2018

Um novo Canal - facilitando as coisas...

O hábito da leitura & as novas formas de comunicação


Claro que estamos vivendo novos tempos!!

Já tentei de toda forma reduzir o tamanho dos textos para publicar no blog... foi em vão!!

Minha mente é indisciplinada para escrever de modo muito suscinto!

Eu até fiz um bom exercício no Tweeter...! Lá você tem que economizar palavras e até letras.

Mas quando se tem liberdade e necessidade de ser menos ambíguo possivel, temos essa questão: falar pouco e dizer tudo é muito dificil... falar muito e correr o risco de cansar o leitor, também acontece... Encontrar o meio termo seria o ideal, desde que as coisas a dizer também coubessem num número pequeno de palavras...

A solução foi migrar - em grande parte pelo menos - para uma outra forma de comunicação, a visual, audível e textual, tudo misturado, produzindo uma mensagem multimidiatica que permitirá, acredito, unir o util ao agradável....

Mas a necessidade de fatiar os assuntos também acontece ali!!

Estou perseguindo uma proposta de reflexão sobre a abrangência da Capoeira, sob  ponto de vista do seu impacto no praticante.

Esse assunto me atrai há longos anos!

Na verdade isso foi a minha primeira motivação para escrever, quando escrevi meu primeiro livro: Capoeira, o Caminho do Berimbau. Nesse livro eu comecei a entrever a complexidade e a abrangênccia do aprendizado de capoeira, vez que parecia, principalmente para o leigo ou para o neófito, que a capoeira era estritamente uma pratica corporal, improvisada, que acumulava memórias de competências de agilidades e que iria produzindo no praticante uma série de habilidades!!

Logicamente a cada dia vejo que essas possibilidades e essas consequencias vão mais além!

Vejo hoje, para efeito de um debate inicial no meu Canal no Youtube: Capoeira Com-Ciência, que essa lista de impactos é cada dia mais ampliada, conforme minha percepção se amplia e conforme outros aprendizados me chegam, o que me fez visualizar a minha pizza de saberes que a  Capoeira vai trazendo para os seus adeptos.



UMA PIZZA DE SABERES



Nessa pizza podemos verificar uma série de fatores com os quais os capoeiristas lidam enquanto  aprendem, enquanto se desenvolvem praticando, aprendendo e estudando capoeira!

Esse tema, como pode-se notar, é gigante!!

É como se tentássemos abarcar a capoeira no seu todo, o que já foi dito por um de seus mais importantes pensadores, Mestre Pastinha, que já dizia: O seu fim é inconcebível ao mais sábio dos Mestres! 

Ou seja, por mais que avancemos na compreensão desse fenomeno que se tornou e a cada dia se torna a nossa Capoeira, Herança de nossos ancestrais afro-brasileiros, escravizados e mantidos em cativeiros alguns até a própria morte, por maltratos, torturas e sofrimentos, temos que entender que a grandeza de uma reação a tamanha tragédia, não poderia ser por um caminho simplista, ou curto!

A Capoeira é um legado que traz em si todas as dimensões de um ser humano livre!!

Essa liberdade alcança muito além do corpo!

Ela tem que passar por outros caminhos mais complexos e mais profundos!

A Capoeira é um instrumento complexo, profundo e abrangente para tanger nossa condição humano da forma mais incrível que eu já vi ou ouvi falar!!

A última percepção que vi da capoeira, me levou a entender que ela lida com o que hoje se chama Inteligências Múltiplas, dada a abrangência de fatores que ela impacta, tanto quanto interfere e, por que não dizer, modifica, estimula e até amplia...!

Segue um outro gráfico, coincidentemente parecido com a minha Pizza de Saberes da Capoeira, só que lidando no terremo mais metafísico da questão, desenvolvido pelo Mestre Adelmo, de São Paulo (na verdade de Brasília, mas transferido para Sampa há um pouco mais de uma década!).

O diagrama da Capoeira, segundo o Mestre Adelmo:

Autor: Mestre Adelmo - SP


Nessa visão do Mestre Adelmo, o que vemos são elementos simbólicos e metafísicos por trás da Capoeira, visão diferente da minha, que sou mais sociólogico, por assim dizer! Mas isso não muda o fato de que esses fatores também estejam entrelaçados com a prática da Capoeira.

Quero, na verdade, me desculpar com as pessoas que me acompanham aqui neste blog, dizer a elas que continuo na busca da compreensão e da difusão de minhas percepções dessa Arte maravilhosa, mas estou presente também no Canal do Youtube, onde posso fazer uma comunicação mais simples e mais direta, usando uma abordagem mais informal e mais natural da linguagem e expressão verbal, adicionando elementos que podem enriquicer mais os meios de transmissão dos saberes de nossa Capoeira.

Venham portanto, acompanhar e degustar nossa Pizza dos Saberes da Capoeira, no Canal Capoeira Com-Ciência no Youtube....

segue o link para facilitar esse acesso:

Capoeira Com-Ciência


Forte abraço!!

Mestre Squisito

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

A perigosa Reentrada na Atmosfera da Capoeira

Se afastando da Capoeira, cuidado ao voltar...!!


Tenho observado há tempos um fenômeno que é muito conhecido da maioria dos capoeiristas, mormente os que estejam em franca atividade, produzindo, treinando, dando aulas, vivendo-a, enfim. Esse fenômeno é muito comum e se caracteriza pelo afastamento, em maior ou menor tempo, do movimento que a capoeira produz, de natureza social, desportiva, política e, principalmente, competitiva, onde todos conhecem todos, se unem entre si, os próximos e se competem, os mais distantes.

A capoeira é uma entidade viva. Tem uma energia densa e complexa. Só os iniciados nela a compreendem o suficiente para amá-la ou deixá-la, dependendo do momento histórico em que se aproximem, se tornem capoeiristas, ou façam parte daqueles que dominam um determinado momento da sua História.

A Capoeira é muito forte! Forte em seus elementos de união, como também naquele tipo de resistência que permite aos seus praticantes, participantes, mestres e adeptos em geral, se tornarem verdadeiros guerreiros do bom combate (lutam contra a covardia, a tirania, a ignorância, etc.), como também existem os que combatem por si mesmos, formando grupos altamente unidos em torno de uma ideologia estabelecida pelo seu líder, que também é muito comum em nossa Arte.

A capoeira também tem um respeito muito grande pelos seus ancestrais. Sem dúvida tem!

Esse respeito é tão grande, que por causa disso alguns adeptos querem se tornar velho mestre muito cedo, daí a razão de pessoalmente eu ter cunhado uma patologia social muito comum na sua prática, que denominei: Síndrome da Velhice Precoce. Ou seja, pessoas que, embora razoavelmente novas, já querem se comportar como se fossem um mestre antigo, naturalmente para ter direito ao tratamento como tal e com isso ter regalias, como ter um tratamento diferenciado, receber homenagens, ser respeitado e, principalmente, ser poupado da obrigação de estar em forma, treinar, praticar, ensinar, jogar inclusive, etc.

Por tudo isso é que o verdadeiro Velho-Mestre, tem muito respeito dentro da capoeira.

A combinação dessa vontade de ser importante e a momentânea ou demorada necessidade de se afastar da capoeira, no entanto, produz um perigoso efeito de uma desconfiança e muita restrição aos que incorrem ou simplesmente se afastam por problemas que eles não podem controlar. Os capoeiristas olham com muita indignação aqueles que se afastam. Mormente os que voltam. Pior ainda, os que voltam e reivindicam seu direito às regalias dos velhos mestres.

Nesse momento é que se observa melhor esse fenômeno: a reentrada na atmosfera da Capoeira!

Imagem da reentrada na atmosfera da Terra


Já assisti muitas vezes a manifestação da indignação dos capoeiristas com relação a isso. É natural que quem está na labuta constante e exaustiva da prática de uma Arte-esporte, as vezes lutas inglórias, desgastantes viagens para participar de eventos, trabalhos dando aulas e promovendo eventos, enfrentando sérias restrições de meios, o que é outra faceta da luta dos capoeiristas, superando barreiras e inúmeros tipos diferentes de restrições e, de repente, surge alguém que para eles "abandonou o barco", quase sempre num momento difícil, mesmo porque todos os momentos da História da Capoeira são difíceis para quem está naquela situação, sustentando-a, fazendo-a se tornar hoje, um dos maiores movimentos da cultura popular da História de nosso país, já extensiva ao mundo inteiro, que combina em sua prática a educação, a prática desportiva de grande valor, a socialização, a Arte musical e o aprendizado prático de instrumentos rudimentares, mas que dão àqueles que nada sabiam de música, que não tiveram oportunidade de nenhum aprendizado musical, se tornarem muitas vezes excelentes cantores, ótimos percussionistas - alguns se profissionalizam e são respeitados nisso... enfim, a capoeira é múltipla e no caminho de quem a faça estão inúmeros desafios de superação pessoal e coletiva.


Esquecendo as contribuições e se tornando hostil aos reentrantes



Esse fenômeno, também, por vezes, guarda um lado que o torna delicado e até perigoso, pois quem, na sua vontade de retornar para o epicentro da capoeira, pula algumas gerações entre sua saída da cena e seu retorno, pois a capoeira é viva e de revezamento constante entre os seus praticantes. Sempre tem aquela pessoa que está no seu comando a cada momento, quem está representando sua energia, sua força, sua pulsante atração para quem a vê e, mais ainda, para quem teve que se afastar ou se afastou por vontade própria!

Nesse contexto, encontramos um outro fenômeno social, esse se trata de uma característica fundante da nossa sociedade como um todo, que é a questão da falta de memória ou fácil esquecimento da própria História. Nada sabemos, de fato, de nossa História. Por isso somos um povo sem memória. Isso é tão verdade que muitos políticos, por exemplo, já condenados e até banidos do cenário da política, voltam tempos depois e se aproveitam dessa falta de memória e se reelegem sem nenhuma dificuldade, pois ninguém se lembra mais o que ele fez de errado!

E se isso é verdade com relação aos erros, também é verdade com relação aos acertos. Ninguém se lembra mais do que aconteceu de bom, da contribuição de quem esteve no momento que teve que lutar pela capoeira, de sustentá-la e de fazê-la seguir seu curso na História, reificando-a em cada nova página que a História do contexto em que ela se insere, assim é que a Capoeira sempre acontece!

A Capoeira precisa sempre desses guerreiros para reenviá-la para o futuro. A cada momento, uma nova geração surge e retoma sua sustentação, carregando aquele bastão de sua conduta para as próximas gerações e, esse momento e essa energia, já acontecem por longos séculos. Alguém tem sempre que estar carregando esse importante bastão. Senão a chama se apaga e a capoeira perde sua força!

Quando se afasta, a principio, o capoeirista abdica de todos os seus direitos adquiridos durante seus dias de dedicação à Capoeira!

Logicamente, essa ideia de "abdicar" é uma visão extrema! É como se admitíssemos que somos todos ingratos e isso não é verdade!

Essa possibilidade de acontecer esse esquecimento na verdade existe!

Isso acontece porque as gerações seguintes, depois de algumas outras, aquelas que conheciam o trabalho, o jogo, a competência, a dedicação ou o que for. Simplesmente se tornam vultos dispersos do passado. Somos assim. Esquecemos tudo! Não damos muito valor ao que passou.

O caso de Brasília...! 


Essa cidade foi inaugurada há muito pouco tempo, relativamente, se comparada com centros como Salvador, Rio ou São Paulo e ainda lutamos para conseguir fundar alguma tradição, ou nossas pessoas de referência, que possam ser consideradas representantes da nossa tradição.

Mas se olhar direito, a gente vai ver que já temos algumas características bem definidas, bem reconhecidas. Uma delas é o fato de nossa capoeira ser respeitada por todo canto. Temos razões de sobra para verificar e acreditar que temos uma capoeira forte, saudável, reconhecida como dentre as melhores praticadas no Brasil e no mundo afora.

Ai resta uma questão: de onde vem isso??!! De que raízes vieram essa capoeira forte e respeitada que nosso Distrito Federal respira?! Quem ou o que produziu essa linhagem de capoeira que se tornou tão importante?! Logicamente isso não nasceu hoje, ou exclusivamente com a geração que ora habita e ocupa nossas rodas, nossos eventos, no cenário de Capoeira do Distrito Federal...!

Nascida na década de sessenta, a cidade já alcançou sua maturidade e personalidade em termos de Capoeira! De onde vem isso?! Certamente essa geração das primeiras décadas do ano 2000, já é herdeira de alguma base de conhecimento, de uma força e uma energia técnica e estética que alguém criou. Não temos como negar isso. Mas se não houver a quem agradecer por isso, também não teremos de quem herdar. Não fizemos sozinhos.

Outro dia estava em um evento no interior do Pará e um camarada me perguntou:

- Mas se o Mestre Bimba foi tão importante, por que não vemos os discípulos dele?! Onde está a linhagem deixada por ele?!

Eu perguntei para ele:

- Você usa um golpe chamado Armada?! Usa o toque do São Bento Grande de Regional?! Faz evento de batizado, usa graduação, etc?! Então, meu irmão, você é um dos herdeiros da capoeira deixada pelo Mestre Bimba. Mas você, como a maioria de nós, nem sabe disso. Não percebe que você recebeu de graça todo o trabalho e sacrifício que dezenas, talvez centenas de gerações anteriores a você fizeram na capoeira para deixar para seu uso hoje em dia! Ou você pensa que inventou tudo isso?!

Meio sem graça a pessoa teve que reconhecer que estava falando uma grande bobagem quando perguntou onde estava a herança de Mestre Bimba.

No caso de Brasília, o estilo arrojado, moderno, objetivo, eficiente, ritmado, firme e agressivo tem um ancestral comum: o nome dele é Aldenor Carvalho Benjamin, que ficou conhecido como Mestre Arraia. Que foi um dos pioneiros da capoeira do Distrito Federal e ensinou aos primeiros capoeiristas residentes e nascidos aqui. Ele simplesmente é o grande ancestral comum da maioria dos capoeiristas do Plano Piloto, embora com a dispersão da linhagem em diversos novos nós, as pessoas não mais saibam disso.

Decorrente dessa influência arrojada e inovadora, independente e muito forte, a capoeira de Brasília se tornou um dos movimentos mais influentes na capoeira modernizada em todo o país e mundo afora. Mas, assim como o rapaz do Pará me disse, pouca gente sabe disso!

Brasília criou os primeiros modelos de trabalho com a capoeira fora da Bahia, em sala de aula; em grupos mistos de homens e mulheres treinando juntos; incluindo a calistenia (treino de ginástica localizada, como abdominais e outros exercícios da ginástica estranhos à capoeira originalmente; também aqui se criou o primeiro sistema de graduação fundamentado na ancestralidade afro-brasileira; uniformes, estilos de jogo mais acrobático embora objetivo; essas, entre outras inovações, como ter a primeira mulher a receber uma corda vermelha no Brasil e, portanto, no mundo... enfim, as nossas inovações vão longe!

Mas, como dizia, poucos capoeiristas sabem disso. A razão é a deficiência da nossa memória. Talvez o ensino da ancestralidade devesse ser obrigação dos professores e mestres. Mas não é! Nada é obrigatório e cada um escolhe, prioriza, o que quer ensinar!

Com isso, naturalmente, vão ficando grandes buracos no conhecimento das novas gerações sobre seus ancestrais comuns! Ninguém pode impedir ou mudar isso. Acho.

Como disse acima e como se diz na capoeira: quem não é visto, não é lembrado!

Só mesmo com muita boa vontade iremos preencher essa imensa e injusta lacuna que vai ficando nos legados que chegou até nós.


O outro lado dessa moeda... 


Certamente temos também os casos em que as pessoas que ficaram afastadas voltam e reclamam seus direitos e nem sempre elas tem esses direitos. Não tem como saber. Quem desconhece a História, não vai saber quem é merecedor de reconhecimento e quem não é!

Por isso esse assunto ainda vai circular muito entre nós. Principalmente agora que a Capoeira tem valor, um valor muito maior do que já teve. Um valor que não dependeu de nenhuma ajuda a não ser dela mesma, de seus valorosos guerreiros que lutam todos os dias de suas vida, para que ela ocupe o pódio em que está! A capoeira venceu todos os seus desafios para chegar até aqui, na sua plenitude e cidadania madura. No estágio mais elevado da consciência de seus mestres e professores. A Capoeira venceu porque alguém a sustentou nos seus braços e ombros enquanto caminhava pelos difíceis momentos de ameaças, de perseguição, de discriminação, de desvalorização...!

Mas quem são essas pessoas? Isso não importa. Importante é a Capoeira, uma entidade viva que suplanta todos os seus elos e segue vitoriosa para onde talvez nenhum de nós irá ver!

Só podemos nos preparar, os que hoje seguram essa onda de carregarem a capoeira nos seus braços, pernas, ombros e, principalmente, no coração, sabendo que, no futuro, terão que provar que são dignos de serem reconhecimentos como legítimos velhos mestres. 

Para isso é melhor ter seus próprios discípulos e amigos capoeiristas, pois o coletivo, esse não está preparado, culturalmente, para saber o que houve há algumas décadas, já que a nossa memória não está treinada para guardar informações além de nossa própria aventura pessoal. Nossas vitórias, nossas derrotas. Ninguém estará interessado em contar.

Assim seguimos nosso caminhar rumo ao destino que Deus e Oxalá nos permita cumprir!














quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Évora, um novo capítulo na Capoeira. O verdadeiro encontro de Bambas!

Um novo tempo... ou o resgate dos velhos tempos?!



Após minha participação no último Nosso Encontro em Évora, incrível cidade medieval portuguesa, tombada e conservada com seu ancião estilo urbano, mantendo inclusive seus muros tradicionais da época, em setembro último (2017), me recolhi na expectativa de relatar o que vi e vivi naqueles dias que ali estive. Era um impasse que me colocava num dilema: ou o que eu vi estava completamente fora da realidade da capoeira atual, ou nós, lato senso da capoeira, estamos equivocados em algum ponto!

Pensei, pensei e repensei...! 
O que está errado com a nossa Capoeira...!?
Évora, me trouxe uma felicidade e, ao mesmo tempo, uma angústia...!
Me fez perceber que estamos fazendo uma coisa errada, des-encaminhando nossa capoeira para rumos equivocados e provavelmente sem volta!
Mas demorei muito procurando a maneira certa de falar sobre isso...!
Não quero briga com nossos milhões de felizes jogadores de perna, hoje chamados de capoeiristas, espalhados pelos quatro cantos do Brasil, como também mundo afora!
Não quero criticar ninguém!
Quero apenas ser sincero e se possível útil a essa Arte Secular que abracei e que me abrigou em seu seio generoso de verdades, de mandingas e de tanta energia!

Estava ali, vendo aquela roda cheia de estrangeiros, em plena Praça do Geral, Centro de Évora, onde uma centena de pessoas disputavam, tanto a oportunidade de se expressar naquela roda, ou simplesmente assistir e se deleitar, com os jogos que iam acontecendo, contagiando a todos com sua beleza e, principalmente, com a emoção que despertavam...! 
Emoções fortes rolaram...
Quedas incríveis...!
Entradas perfeitas e saídas competentes... no tempo milimetricamente certos...!
Havia algo que eu não via há longo tempo. E nem me considero tão antigo assim!
Havia um equilíbrio, uma verdade de roda e uma aceitação diferenciada pelo prejuízo que alguém levava durante os jogos!
Onde andaria esse espírito de jogo... que ninguém interrompe quando o jogo flui...?
Onde estariam esses nossos bambas de capoeira, que aceitam quando tomam um prejuízo e não se tornam - como se tornou comum - agressivos...!!?
Onde estariam nossas rodas de capoeira em que todos vibram com os jogos, mas não tentam desprezar quem levou desvantagem?
Eram muitas perguntas que me vinham.
Mas faltava uma questão básica:
o que havia de estranho em nossas rodas de capoeira desde o início da Capoeira Regional de Mestre Bimba, e essa realidade que estamos vendo proliferar nas nossas rodas...!!??


Roda na Praça Geraldo - Évora 2013
(Autoria: Sandra Carvalho)


Algumas luas depois de minhas inquietações, eu finalmente entendi o que estava errado:

- Estamos traindo a causa primeira que Mestre Bimba viu na capoeira, a da objetividade... do jogo efetivo... o jogo de resultado... o fim da capoeira estéril, falsa, sem força e sem expressão... vendida em qualquer esquina do planeta hoje... sem disciplina e sem profissionalismo!

Pois a verdade é que estamos vendo prosperar uma capoeira sem graça!
Estamos misturando nossa necessidade de nos expressar, de nos mostrar nas rodas, de uma forma tão sem sentido, que a maioria dos jogos não dura nem o tempo mínimo para acontecer alguma coisa: alguém já corre e compra...!! É como se a gente quisesse dizer: eu não jogo, mas não deixo ninguém jogar!!!!

Convenhamos...! Precisamos rever isso. Antes que seja tarde!!

Temos excelentes atletas na capoeira...!
Temos excelentes capoeiristas, mas esses que tem essa competência não têm oportunidade de fazer um jogo bonito... alguém compra em poucos segundos seu jogo!! 

O que Évora me mostrou foi mais de uma centena de pessoas educadas, capazes de abrir mão de seu próprio ego, para assistir um bom jogo, reunidas num mesmo evento...!!

Vi mestres criativos e organizados, que não interrompiam um jogo bonito, que sabiam a diferença entre um jogo comum e um especial, cheio de magia, de efetividade e, para mim o melhor, o gol no jogo...! o resultado... ou pelo menos momentos de grande vibração...!!

O que vi também foi uma razão para estarmos perdendo tantos bons capoeiras para outras artes-marciais: não estamos permitindo que ninguém desenvolva um bom jogo de capoeira! Esses jogos são fundamentais para desenvolvermos nossa capacidade de obter resultados no nosso aprendizado!! 

Também acontece que, ao apagarmos o brilho dos jogos de nossa capoeira, nos tornamos sem graça para a platéia. Jogamos para uma plateia alheia que vê uma roda de capoeira e a compara com todos os outros esportes radicas. 

Quem não estiver me entendendo, prestem atenção nas rodas que acontecem pelos quatro cantos: nenhum jogo dura mais de 5 segundos... quando muito!!! Aí eu me pergunto: como vamos desenvolver nossa Arte se ninguém tem tempo suficiente para se manifestar...!? Sem poder fazer acontecer um jogo de decisão,  um jogo bonito??

Infelizmente estamos a cada dia perdendo o brilho de nossa Arte. E enquanto não revertermos essa situação a capoeira estará caminhando somente para o seu extermínio enquanto Arte e esvaziada de seus maiores conhecimentos: a Arte da Sobrevivência no meio de uma situação difícil...!

Depois de alguns meses em que estive naquela atmosfera de bambas do povo, sem estrelas, apenas capoeiristas de brilho, como deve ser, ainda sinto os ecos daqueles momentos e percebo que esse evento (2017) não foi um acidente. Isso se acumulou nos anos que Évora vem se tradicionalizando entre os que ali se refugiam, que se encontram e confraternizam em emoções e alegrias pulsantes, mesmo para os nossos capoeiristas europeus, tão serenos e racionais, eles também apreciam - quem não o faz!! - uma roda bonita, um jogo bonito, uma volta do mundo mandingada... uma boa Capoeira, sem sobrenomes... sem ninguém dominando os momentos da roda, a cantoria, os jogos, um verdadeiro celeiro de bambas, anônimos, só preocupados com uma única e exclusiva coisa: que a Capoeira possa descer ali, na milagrosa transcedência dos desiguais, dos diferentes, dos distintos, dos graduados e não graduados, transmutação de uma energia que se torna a verdadeira chama que todos buscamos para nossa arte, em paz, mas em seu pulsar mais sagrado, mais relutante contra essa hegemonia estéril que está tentando anular nossos fundamentos, transformando-os em regras estereotipadas, medidas pela espessura dos bíceps ou dos abdômens perfeitos...! 


A roda é o lugar do mais fraco encontrar sua afirmação e sua emancipação enquanto ser igual, enquanto o portador da divina chama de Filho de Deus, que tantos pregam, mas tão poucos sabem o verdadeiro significado, na prática! 
Roda também é o lugar do Mestre se encontrar em sua dimensão de respeito ao próximo, aos ancestrais, se conectar na dimensão mais profunda de sua alma. Receber a concessão do sagrado para encontrar sua entidade interior (como dizia o Mestre Decânio) e se manifestar no espaço comum de todas as almas e consciências. 


Mestres ao pé do berimbau 

Roda do gramado - Piscinas de Évora - 2017
(foto: Professor Oclin_


Por isso tudo é que só posso afirmar, depois de contabilizar todos os prós e contras, verificar a efervescência de tantos eventos, cada um clamando por ser o melhor dos melhores, que o Nosso Encontro de Évora é uma dessas tradições que tem muito para ensinar a todos quantos tem a humildade de aprender. 

Por isso que só nos resta panfletar essa rica experiência de todos quantos ali já percorreram: 
   Viva nossa Capoeira de verdade!!
Viva os capoeiristas que não estão permitindo que suas rodas se tornem estéreis e sem nenhum realismo!!
Viva Évora e sua capoeira de bambas de verdade!!!







quarta-feira, 5 de julho de 2017

Mestre Alex, um Carcará do Cerrado


Mestre Alex Carcará


E o tempo e o Guerreiro se encontram!
Os nossos grandes capoeiristas, nunca foram grandes apenas no seu físico. Isso já sabemos! Talvez dentre os maiores e mais expressivos capoeiristas estejam em sua maioria, os de estatura média ou baixa... Tente explicar!!
Aqui no nosso Cerrado, e seu clima agressivo e de extremos, nasce um desses surpreendentes Capoeiras Alex Charles Rocha, o Mestre Carcará!
A sabedoria com que nossos Deuses ungem os nossos Mestres é deveras impressionante!
Aqui o seu Mestre, o Mestre Chibata, se instala e se torna cidadão, vindo da Bahia. Na sua grande magia, a Capoeira dá ao Mestre Chibata a grande inspiração de cultivar no Cerrado sua Arte Baiana, a Capoeira!
Mestre Chibata forma dezenas de discípulos e muitos deles se destacam no cenário da Capoeira do Distrito Federal e expandem seu horizonte para muito além das nossas ordas cerradianas, ou mesmo muito além das próprias fronteiras nacionais...!,
Entre eles se encontra o destemido, Alex Charles Rocha...
Como a inspiração chega nesses momentos, ninguém explica, nunca eu soube de uma explicação que esclarecesse como acontece, mas o Mestre Chibata o nomeia "Carcará" e, como em algumas outras Histórias da Capoeira, esse nome tem poder, como tem poder a Palavra - está na Biblia Sagrada!
Aquele menino franzino e baixote ganha os ares!
Ganha uma grande motivação para superar seus limites!
Ele ganha mais que uma alcunha, como descrevem os portugueses, ganha sua auto-imagem, ganha um desafio, o desafio de voar, de superar a distância e a seca do inverno do Cerrado!
De posse dessa sua identidade secreta, nosso camarada se desdobra para honrar seu Mestre e nunca mais se curva diante do perigo ou de seus limites: ele se dá a obrigação da superação!
Ele se torna um Guerreiro!
Seus olhos agora brilham destemidos diante das adversidades...!
Ele cruza os céus buscando suas soluções...!
Ele escolhe as batalhas mais difíceis e mais dignas de um guerreiro...!
Ao lado do seu Mestre Chibata, tudo parecia mais fácil...!
Então, num dia fatídico qualquer, em que o destino bate a nossa porta trazendo uma triste notícia, a pior possível: Seu Mestre Chibata, parte repentinamente para as Terras de Aruanda, deixando nosso pequeno guerreiro-pássaro, órfão de seu Mestre, de sua força e de sua fonte de inspiração e segurança...!!
Nosso guerreiro agora tem que se aventurar sozinho pelos céus desconhecidos das esquinas da vida!
E sofre grandes decepções como todos os adultos!
As encruzilhadas estão repletas de surpresas, algumas sombrias...!
Mas o Guerreiro se debate diante de todas as intempéries e continua firme na construção de sua estrada, seu Caminho do Berimbau...!
Com seu berimbau na mão, com o nome do seu Mestre Chibata no peito, nosso Guerreiro cresce, exatamente como todo homem devia sempre crescer: prá dentro de si mesmo!
Desvendando os mistérios de seus limites ele vai chamando para si os desafios, cada vez maiores na Estrada da Capoeira, enfrentando ora os lobos da burocracia, ora outros tipos de feras das rodas de Capoeira mundo afora..!
Mas ele aprendeu a voar!
Como seu Mestre ensinou, ele é um Carcará e esse pássaro não recua!
Outros pássaros podem ficar esperando as galinhas-mortas das facilidades, mas o Carcará não, ele "pega, mata e come", como diz a música de João do Vale (1965).
Grandes conquistas, requerem grandes batalhas e nosso guerreiro é um batalhador.
Ele está presente nos grandes movimentos da capoeira.
Está presente e se torna diretor da primeira Federação de Capoeira da Capital.
Inspirado, propõe a criação de uma nova Liga de Capoeira, mais independente e mais flexível, para contornar tantos conflitos criados pelas federações junto à Capoeira...
Entra para o Conselho Regional de Educação Física; batalha junto Governo do DF; viaja para onde tem um berimbau chamando-o...
Entra nos debates de grandes grupos de Mestres e dá contribuições valiosas com sua participação serena e consciente de que nada é extraído das pedras sem muita luta; coloca inúmeras vezes que a legislação é um anteparo para proteger quem quer segui-la e contra para quem não a respeita!
Então, num momento de grande e dramática luta, nosso guerreiro enfrenta uma doença muito difícil e agressiva para todo seu corpo e seu emocional...! Do nada ele apresenta um AVC - Acidente Vascular Cerebral e sofre sérios danos à sua fala e sua condição física...
Mas como um guerreiro e Capoeira, ele se levanta e ginga com a doença!
Supera, contrariando as previsões pessimistas, esse acidente e se recupera, principalmente cantando!
A Capoeira é seu escudo, como sempre e com ela, ele novamente volta a voar em sua vida de pássaro incansável...!
Sobe novamente o ritmo do São Bento e se associa com a ABPC, trazendo para si uma grande carga de responsabilidade e assumindo seu novo desafio, trazer para o DF, novamente, a Reunião Anual dessa Associação Brasileira dos Professores de Capoeira, comprando para si, o jogo de coordenar essa atividade de grande repercussão nacional e internacional, onde grandes mestres do Brasil e do Exterior se reúnem uma vez por ano e realizam essa grande festa da Capoeira.


O último podium de um Campeão!



Foto: Mestre Huguinho - DF
Palmas pra Capoeira - 2017 - Palmas - TO



A vida é o grande desconhecido, em seus caminhos, que sempre nos surpreendem.
Nosso campeão viveu dias de grande angústia no momento que Deus levou seu Mestre Chibata para as Terras de Aruanda...! Ele, ainda muito jovem, teve que enfrentar os mais incríveis desafios, para se manter na capoeira, para continuar sua caminhada e para ser, afinal, aclamado pela Velha Guarda da Capoeira do DF como Mestre de Capoeira...!
Mas ele, após muitos anos em que esteve no comando de sua vida e travando grandes batalhas em seu caminho, vem a Palmas, Tocantins, para o que seria, para ele, mais um evento, mais uma vivência, mais alguns momentos de grande aprendizado junto à grandes Mestres ali presente... Era mais uma dentre suas centenas de eventos...!
Mas, como o destino é um senhor do qual nada sabemos, arma uma das suas peças, colocando a todos nós e ao próprio Mestre Alex Carcará, principalmente, numa grande e definitiva encruzilhada...!
Após participar em três dias de atividades, empolgado e feliz, aproveitando cada segundo daquelas horas, jogando, cantando, tocando berimbau, conversando animado com as dezenas de amigos ali reunidos, chegou a dar uma aula de alongamento e aquecimento antes da "Corrida do Capoeirista", a qual ele próprio participaria...
Parte nosso campeão e chega em segundo lugar na categoria dos maiores de 50 anos... entusiasmado, feliz e super integrado em todo aquele movimento...!
A foto acima mostra o momento em que nosso Campeão chega em segundo lugar e sobe ao podium improvisado da Corrida do Capoeirista, que termina, por praxe, numa roda de capoeira, onde os competidores tem que demonstrar que são capoeiristas... jogando e participando da animada roda do final da Corrida...!
Tudo na mais perfeita ordem...!
Na noite de sábado, após todo o desgastante dia, para todos os participantes, com corrida, rodas, treinos, palestras, etc., todos os mestres se recolhem ao hotel e buscam relaxar. Entre eles nosso Campeão...!
O domingo começa sem pressa, com todos se reunindo em torno do ultimo café da manhã coletivo e tudo ia muito bem...!
No almoço na casa do Contra-Mestre Asa Delta, todos reunidos e a poucas horas de partir o avião, o Mestre Alex Carcará se sente mal e pede para repousar num dos quartos da casa... 
Poucos minutos depois, ele se sente pior e teme que possa estar tendo um novo AVC...!
Preocupados todos nós, há um consenso dos presentes de que ele deveria ser levado ao atendimento num posto de saúde das proximidades. Tudo é feito em poucos minutos. 
Por volta das 14,00 horas do domingo, ele sai com alguns amigos e um discípulo seu que havia participado do evento, o ContraMestre Coruja.
Em mais ou menos 50 minutos, todos ali presentes recebem a noticia de que ele havia sido devida e prontamente atendido. 
Dali, descartada a tese de AVC, uma das maiores preocupações do Mestre Carcará, pois os médicos chegam a conclusão de que existe uma trombose em sua perna direita. O problema não era o que seria o pior, ou seja, um AVC, mas não tinha nenhuma tranquilidade com a possível trombose... Claro!
Mas, indedendente do diagnóstico inicial, ele é levado para o Hospital Geral de Palmas, onde é submetido a diversos exames, de imagens, eletros, sangue, etc. 
Tranqualizados todos nós, cada um seguiu seu caminho de volta às suas origens, principalmente porque os voos eram mais ou menos próximos.
Estava decidido pelos médicos que ele deveria ficar sob observação e acompanhamento.
Já em Brasília, a cada minuto novas informações sobre o paciente e tudo ia bem. Mais relaxados, ficamos sabendo que ele deveria ficar 72 horas em observação.
Já quase tranquilos com todo o epsódio, estou em Brasília e, pouco depois das 15,00 horas da segunda-feira, dia 26JUN2017, após o almoço e ansioso pelo primeiro contato pessoal entre os capoeiristas de Palmas e ele, o paciente Alex Charles Rocha, descansando após o almoço, sou despertado com dezenas de chamadas...!
Uma voz assustada, quase balcucia do outro lado: o Mestre Alex faleceu!!!!!
O mundo parou!
O berimbau silenciou...!
Qualquer coisa deixou de fazer sentido por alguns minutos!
Ninguém sabia o que fazer!
Era uma daquelas situações que ninguém nunca está preparado!
O diagnóstico da causa-mortis foi a veia aorta que não teria suportado a pressão sanguinea!
Nosso campeão seguiu seu caminho para outro Plano!
Foi se juntar com seu Mestre Chibata!
Cumpriu sua missão, ou grande parte dela, pois se continuasse ainda teria muito caminho para caminhar, muito o que fazer, muito o que ensinar, muito o que aprender!
Pois o Caminho do Berimbau é o Caminho da Nossa Vida!
Até onde a vida vai... até onde Deus permite!
Mas sempre levando nosso berimbau em nossa mente, em nosso corpo, em nossa Alma!
Descanse em paz desse Plano aqui, Guerreiro!
Agora seu caminho é nas Terras de Aruanda!
Com a Luz de Oxalá apontando o seu novo Destino!!
Vá em paz, guerreiro da luz, pois sua obra está completa! Seu legado será o farol para seus discípulos e seus filhos seguirem seu caminho e construir sua própria história, na grande caminhada de cada um deles, rumo ao ocaso dos tempos, carregando aquele mesma chama  que você recebeu de seu Mestre Chibata e que agora pertence aos seus descendentes!

Adeus, amigo!!